segunda-feira, 7 de julho de 2014

Especial 105 anos - Conversa de feira, em Afogados da Ingazeira/PE


Não basta ir à feira, escolher o produto mais fresquinho. Todo sábado é dia de feira municipal na cidade Afogados da Ingazeira(PE), a quase 400 km da capital, Recife. A tradição movimenta a economia da cidade junto com o pagamento dos benefícios previdenciários.

Quem mora na zona rural ainda faz uso do famoso pau de arara. Os carros chegam lotados e saem mais ainda. Homens, mulheres, sacos de mantimentos, verduras, frutas e, até animais dividem o espaço. Apesar de ser considerado “irregular”, o transporte ainda é muito utilizado no Nordeste do Brasil, como um substituto ao ônibus.







Na feira o bom mesmo é dar uma parada para uma conversa,  de sotaque arrastado, sem pressa e com palavras típicas do homem do campo, um universo que cheira a poesia e sabedoria. “ Estamos no céu, não sei nem se temos outro lá em cima, mas sou um homem feliz cá na terra”, diz com largo sorriso o  "Otávio", assim mesmo, sem precisar de sobrenome, como prefere ser chamado.

Pai de 6 filhos, o agricultor é aposentado pela Previdência Social. Com o que recebe garante o sustento da casa na comunidade de Jatobá de Monte Alegre, a 14 km da cidade de Afogados da Ingazeira(PE). O benefício é o resultado dos anos trabalhados, mas nem a idade ainda o afastou do que mais gosta: botar as mãos na terra, lavrar, semear e colher vida.


Tanto trabalho e dedicação à lavoura não garante o retorno financeiro. Para ele, mais do que uma atividade, vender na feira é também um lazer, onde faz amigos e tem freguesia certa. “ O ganho, às vezes, é de R$ 50 livres, depois de pagar os gastos como, por exemplo, a montagem da barraca e os sacos plástico, mas tenho todo mês o dinheiro da minha aposentadoria depositado, sem falhar”, comemora.  Impossível conversar com esse homem simples e não dar boas gargalhadas. De repente chega uma cliente e pergunta. Tem feijão debulhado? Sem pestanejar brinca: " A gente cata na roça, amarra, traz pro comércio e ainda querem debulhado. Agora só falta querer "cozinhado", sorri com abundância, assim como a cliente.

Quiabo da lavoura do Sr. Otávio


Das letras conhece pouco. “ Apesar de analfabeto aprendi apenas umas palavras de amor que escrevia para minha namorada (hoje esposa). A roça é meu lugar, aliás não tem canto melhor. Planto milho, feijão, mas minha lavra maior é a do quiabo que rende uns quatro meses”, explica numa prosa boa de ouvir. Na simplicidade tão característica do homem do campo também faz sabedoria. “ Para viver e saber o que é o melhor da vida não tem que ter a leitura somente. Tem que ter a intenção e a boa vontade de saber organizar, fazer e produzir”, poetiza.




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Água retirada da fonte ainda é vendida de porta em porta


Pau de arara



(Denise Martins)
Fotos: Edson Andrade

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